sábado, 11 de janeiro de 2014

Melhor Roteiro Adaptado / Melhor Roteiro Original




Indicados:
- Christopher Hampton por “Desejo e Reparação” (2007);
- Ethan Coen e Joel Coen por “Onde os Fracos Não Têm Vez” (2007);
- Paul Thomas Anderson por “Sangue Negro” (2007);
- Ronald Harwood por “O Escafandro e a Borboleta” (2007);
- Sarah Polley por “Longe Dela” (2006).

Briga de cães ferozes e sedentos por ouro. Dentre os cinco indicados para o prêmio de Melhor Roteiro Adaptado, três deles apareciam como favoritíssimos ao Oscar de Melhor Filme, estava certo que o maior prêmio da noite ficaria com um dos três: “Sangue Negro”, de Paul Thomas Anderson; “Onde os Fracos não têm vez”, dos irmãos Coen; e, um passo atrás, o romance de Joe Wright, “Desejo e Reparação”. A obra de Joel e Ethan Coen acabou sendo coroada como a melhor daquele ano – filme, direção e roteiro, deixando o primeiro com cara de  fome e o terceiro, literalmente, a ver navios .

“Onde os Fracos Não Têm Vez” chegou mansinho até a temporada de premiação. Fora o prêmio de ator coadjuvante, dado desde sempre como certo, nada parecia exato nesse percorrer. Apontado pela maioria como um filme que exagera nas cenas de violência física, visto nenhuma miséria em derramamento de sangue e nas cenas de tortura humana, o grande trunfo dos Coen poderia ser também o início de uma derrocada sem fim: a academia não é tão simpática com trabalhos que possam diminuir a real necessidade da violência. São poucos os filmes que usam da violência para fazer pensar, sem soar gratuito. Usar do recurso agressão é violar alguns direitos da cristandade. Isso é grave lá fora. Enfim, é para isso que existem Tarantinos, um único Von Trier e os próprios Coen. Ambientado em clima desértico, algo próximo ao Texas, totalmente tomado pela desesperança na falta das cores que pretegem, o roteiro, também escrito pelos irmãos diretores, é baseado em obra do aclamado escritor Corman McCarthy, que ainda tem outra obra que virou filme, o apocalíptico “A Estrada”, mais uma história pesada, diminuta das mais remotas crenças. Portanto, era a pulsão da escrita de McCarthy somada à assimétrica imaginação dos Coen. Característica essencial na trajetória dos irmãos, a história de crueldade e perseguição ainda consegue ter espaço para uma refinada dose de humor negro, tão bem aplicada na construção do roteiro e, mais, num dos personagens mais assustadores da história do cinema contemporâneo, Anton Chigurh, premiada interpretação do ator espanhol Javier Bardem.

Do outro lado, latindo alto também, vinha a obra secular do americano Paul Thomas Anderson, que trazia de volta ao prêmio (como favorito) um dos maiores ícones do cinema atual. Daniel Day-Lewis, o ícone, disse certa vez que seu personagem em “Sangue Negro” tinha sido um dos mais difíceis de compor até então. De fato, entende-se o motivo. Thomas Anderson, roteirista e diretor da obra, construiu uma saga inominável, onde o petróleo aparece como veia propulsora das energias vitais de um homem. Um homem feito de óleo, coberto pela fuligem da ambição, condenado ao modo de sobreviver “ao e no” capitalismo. Fruto de uma ganância inesgotável, diretor e ator erguem simplesmente um marco ao desvendarem as ambições do início do século. A cobiça do Homem, a avidez de uma sociedade, todas assinadas na figura de um único ser humano. A crítica e nós espectadores caímos de joelhos, veneramos quase que completamente.

O roteiro de “O Escafandro e a Borboleta” vem das mãos do dramaturgo inglês Ronald Harwood, é dirigido por um norte-americano e atuado por um mestre da arte na França. O filme baseia-se na história real do jornalista francês Jean-Dominique Bauby, que após um acidente cerebral fica condenado à mudez e à paralisação dos movimentos, permanentemente vegetal (não!). É para isso que Julian Schnabel (o diretor) assume a postura de não vitimar Bauby. Como mais um personagem da vida terrena, o acamado pensa, sofre, deseja a individualidade, sua comunicação é clara, mas inaudível.

A surpreendente realizadora Sarah Polley também aplacou um filme entre os indicados. Além da direção do longa, Polley também escreveu o roteiro de “Longe Dela”, baseado em conto de Alice Munro, que, embora já tenha sido retratado em outras fitas (talvez não com a mesma intensidade), conta uma história um tanto atípica, mas sem dúvida plena de todo o respeito da academia. A obra conta a história de um casal já na velhice que entra em crise após a mulher dar os primeiros sinais do Mal de Alzheimer. Por iniciativa própria, ela decide se separar do marido e se internar numa clínica de repouso. Sarah Polley é uma diretora profunda, extremamente deliciada e na sua estreia se confirma como uma escritora igualmente aflorada, de uma mente que absorve tempos que estão além do seu ser.

Quem só fez cara de mal mesmo foi o doce “Desejo e Reparação”, doce amargo de uma lendária paixão. Mas tinha o respeito de ser um favorito, e sim, é um belo filme. Fotografia de tirar o ar, trilha sonora rica, atores competentes em momentos de brilho, como Saoirse Ronan e Romola Garai em bons papéis e desempenhos que marcaram suas carreiras. O filme como um todo é correto, embalado no pacote, pronto para entrega. Assim, cru. Ian McEwan, escritor que teve sua obra como inspiração para o roteiro, pode não ter ficado tão feliz com o resultado raso do roteiro de Joe Wright, que não saiu do mesmo e acabou por não fazer mais que a obrigação, sem calorosos aplausos e sem vaias. Merece reconhecimento!



Indicados:
- Brad Bird e Jan Pinkava por “Ratatouille” (2007);
- Diablo Cody por “Juno” (2007);
- Nancy Oliver por “A Garota Ideal” (2007);
- Tamara Jenkins por “A Família Savage” (2007);
- Tony Gilroy por “Conduta de Risco” (2007).

Coube ao mundo do cinema reconhecer o trabalho de mais uma estreante na produção de roteiros cinematográficos. Diablo Cody já tinha feito muito sucesso com seu livro, lançado alguns anos antes, onde dissertou sobre sua experiência como stripper e atendente de tele-sexo numa cidadezinha de Minnesota. Grande passo da Academia. Pessoas assim chamam a atenção por si só: roupas extravagantes, cabelos descoloridos na base de um corte bizarro, trajetórias que realmente merecem o compartilhamento. Se não bastasse todo o ar fresco que Cody já trazia consigo, a mulher fora dos padrões hollywoodianos também tinha nas mãos um dos melhores roteiros daquela safra: “Juno”.

A história da adolescente que engravida logo na sua primeira relação sexual e resolve procurar um casal para, enfim, doar o pequerrucho ganhou o mundo e o gosto da crítica. O Oscar de roteiro original não veio pela possível originalidade da história, que se traduziria somente como mais uma fábula edificante se não fosse a delicada e ao mesmo tempo sincera mão de Diablo Cody ao escrever essa mini saga. Sob as nuances de sua imaginação, Cody impede que os olhos desfoquem do “trágico” e se prendam a fofurice que a vida deve ser. Sim, há momentos fofos e são muitos, mas há também diálogos inspirados, boas piadas e humor negro latente, borbulhando principalmente na personagem-título, interpretada por Ellen Page. Méritos também ao diretor Jason Reitman, que é espetacular em colocar histórias desse tipo na tela. Com maestria, o trio (roteirista, diretor e atriz) fez história na noite da premiação, saindo dali uma respeitada roteirista – com um Oscar na mão -, um reconhecido diretor e uma atriz já vista como promessa para os próximos anos.

Os outros quatro roteiros que concorriam junto com “Juno”, apesar de boas obras, não tinham muitas chances na competição. Mesmo que “Ratatouille” tivesse ganhado, alguns momentos antes, o prêmio de Melhor Animação, a história do ratinho “chef” de cozinha não tinha (apesar de originalíssima) todo o apelo popular que “Juno” foi ganhando ao longo dos dias que antecederam a premiação, também não tinha a sonora distração aos problemas da vida que “Juno” também tem.

Assim como “Conduta de Risco”, filme dirigido e escrito pelo também estreante Tony Gilroy, que se recebesse o prêmio seria por dar o suporte assombroso que deu a sua história, aos seus atores e, claro, por sua estreia. Texto complicado e recheado de dualidades, com personagens acima do perfil dos complexos, Gilroy fez trabalho de gente grande. Saiu do Kodak Theatre sem nada, mas viu sua atriz coadjuvante brilhar num Oscar meramente estranho (Cate Blanchett era a grande favorita por sua personificação de Bob Dylan em “Não Estou Lá”, vide o espanto de Tilda Swinton quando Alan Arkin anunciou seu nome).

Mais timidamente correndo atrás e representando o aclamado (?) cinema independente dos EUA, vinha “A Garota Ideal” e “A Família Savage”.  Filmes com fotografia parecida, clima de emoções também semelhantes, as duas obras preencheram as duas últimas vagas ao prêmio de Melhor Roteiro Original. Em “A Garota Ideal”, Ryan Gosling é o estranho homem que se apaixona por uma boneca inflável, conversa com ela, realiza seus desejos e a leva para a cama. Seria engraçado se não fosse tão triste. O roteiro faz o caminho inverso de qualquer outro, ao invés de “mamar nas tetas” de seu protagonista, a obra investe também nos personagens secundários, que se tornam tão interessantes quanto o eixo principal que conduz o filme.

“A Família Savage” não tem protagonista, é dividido por dois grandes atores que mesclam drama e comédia como ninguém e por uma diretora criativa no modo de levar a trama. A cena independente geralmente não faz mais que mera presença nas premiações do Oscar, dessa vez não foi tão diferente, mas há de se anotar que, entre os indicados de 2008, vários indies foram além do simples convite para a grande festa.

por Gustavo Pavan

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