quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Hester Street



HESTER STREET (1975, 90 min)
Produção: Estados Unidos
Direção: Joan Micklin Silver
Roteiro: Joan Micklin Silver
Elenco: Steven Keats, Carol Kane, Mel Howard, Dorrie Kavanaugh, Doris Roberts, Stephen Strimpell.

Hester Street (1975), que jamais recebeu título no Brasil devido ao fato de o filme jamais ter sido distribuído por aqui, é uma fábula de abordagens sócio-culturais acerca das relações inter e intrapessoais. Adaptada da obra Yekl: A Tale of New York Ghetto (1896), de Abrahan Cahan, essa produção nos apresenta um relato a respeito da vida de Yekl, um imigrante russo judeu, que foi para os Estados Unidos, onde pretendia se fixar e trabalhar a fim de juntar dinheiro.

Yekl, já nos Estados Unidos, adotou um nome mais anglicizado – passou a se chamar Jake. Já estava na América há algum tempo, inclusive envolvido com Mamie, uma dançarina que tem guardado suas economias, quando recebe a notícia de que sua esposa e seu filho finalmente virão se juntar a ele. Essa notícia lhe causa ao mesmo tempo alívio e preocupação, já que têm saudades do filho, mas não sabe o quão bem Gitl, sua esposa, irá se adaptar aos costumes norte-americanos. Não tarda para que os problemas entre Jake, Gitl e Mamie comecem, sobretudo porque Gitl não consegue abrir mão dos costumes de sua cultura e Jake não consegue se interessar por ela, justamente por causa de seu interesse por aquilo que Mamie representa (e também por aquilo que ela tem: dinheiro).

O choque entre culturas é evidente e isso é mostrado desde o momento inicial em que vemos o casal Jake e Gitl. Ela notadamente destoa das outras pessoas devido à sua vestimenta e aos seus trejeitos. Ele, não fosse pelo sotaque bastante acentuado, facilmente se passaria por um americano, como todos os outros ao seu redor. Gitl, mais do que não compreender como poderá sair às ruas com o próprio cabelo exposto, não quer sair às ruas assim – o tempo todo ela discute o seu direito de agir conforme sua cultura e de ser quem é, apesar de estar agora sob a tutela de outro Estado. Se Gitl representa os costumes, a tradição e, mais do que isso, o direito de querer estar sob tais tradições, Jake representa o capitalismo desmedido que se molda a qualquer coisa a fim de conseguir aquilo que se quer. Não é à toa que essa obra termina com Jake numa situação não muito confortável¹: o enredo faz questão de se apresentar metafórico e ao mesmo tempo irônico em relação ao personagem principal. Aqui se evidencia a política do autor da obra literária, Cahan, notoriamente socialista.

A Academia reconheceu o trabalho de Carol Kane, que foi nominada como Melhor Atriz, ainda que sua personagem seja, a meu ver, bastante coadjuvante nessa trama, cujo enfoque é enfaticamente no personagem masculino central, Jake. No entanto, num ano em que houve poucas interpretações femininas realmente fortes como protagonistas, Kane chegou fácil à lista das cinco nominadas. Como curiosidade, há o fato de que ela é uma de apenas 28 atores que foram indicados numa categoria de interpretação por uma performance em língua estrangeira ao inglês. Tendo a maior parte do seu desempenho em Iídiche, Carol Kane é também a única atriz já nominada por uma atuação nessa língua. O filme é, sobretudo, reconhecido pelo modo fiel como retratou o final do século XIX, quando houve bastante imigração de judeus para os Estados Unidos, que se fixaram em grande parte na Rua Hester, que dá título ao filme.

INDICAÇÃO:
- Melhor Atriz: Carol Kane

por Luís Adriano de Lima


¹ Spoiler: Jake, encantado pelo que Mamie pode lhe oferecer com seu dinheiro, decide abandonar Gitl para se casar com a amante. Como a esposa não lhe concede o divórcio, Mamie, amando Jake e sem saber das reais intenções de Jake, propõe um acordo com Gitl, no qual ela deve conceder o divórcio em troca de uma boa quantidade de dinheiro, o que lhe permitiria se estabelecer melhor nos Estados Unidos. Quando, por fim, Jake se casa com Mamie, ela não tinha quase nada, já que quase todo seu dinheiro ficou com Gitl, agora enriquecida.

Um comentário:

Kamila disse...

Uma pena que esse filme nunca tenha sido lançado no Brasil. Parece ser muito interessante. Adorei o texto!